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21 outubro, 2014

BOA VIAGEM, MEU IRMÃOZIM!



Lá pelo início dos anos 80, fomos – Junim, Piu e mais alguém cujo nome não me lembro – visitar um fornecedor da Leiteria Mumu. Na propriedade havia uma olaria. Aproximei-me e fiquei observando a lida de um homem de cabelos brancos e um menino de uns quinze anos, no máximo, manuseando o barro, amassando-o e colocando-o nas formas. Na volta, vim calado, o que não é muito comum de acontecer, como se sabe. A cena ocupava-me as parcas sinapses.
Quando chegamos à casa do Piu, onde costumava me hospedar quando ia passar os finais de ano em Caldas – MG, fui direto à máquina de escrever. Arranquei pedaço de um cartaz do Espectro Contínuo, banda rockeira de Cosmópolis - SP, e enfiei na máquina. Comecei a catamilhografar. Junim veio com o violão, pôs o pé na cadeira onde eu estava sentado e começou a dedilhar. De mim, as palavras saiam compulsivamente, apesar de meus dedos gagos. Lembro-me de sua pilhéria:
- “Do jeito que você escreve, ainda vai ser escritor. Dizem que escritor não sabe escrever à máquina.”
Terminei o poema, ainda sem nome, e recostei-me na cadeira. Junim perguntou:
- “terminou?”
Eu respondi:
- “Sim. Falta o nome.”
Ele retrucou:
- “Bota ‘Sô Vicente’, que é o nome daquele senhor que estava fazendo os tijolos.”
Dito isto, arrancou o pedaço de papel da máquina, sentou-se e cantou. Nossa música ficou pronta ali. O canto está na minha mente até hoje. O poema é o que se segue:

SÔ VICENTE

o oleiro
na sua santa inocência
atolava sua imaculada mão na argila
e fazia os tijolos
que formariam o muro
barreira
entre o pomar do patrão
e a fome dos seus filhos

o bom deus
como de hábito
espalhava suas eternas bênçãos
sobre o homem de boa fé
seculus seculorum
amém...

AMÉM?!

Ps.: a foto é da vez mais recente que nos vimos.