04 agosto, 2007

DIRETO E TORTO


direto

corpo: vital aríete
vestuário: mero adereço
mesmo a alma não passa
de opcional penduricalho
daquele que vive (n)o porvir

o corpo é o que porta
portanto o que importa

primo pela estima
mijo pra estética
troglodita convicto
ando pra etiqueta
apraz-me
antes me atirar da proa
que bocejar no salão de festas

beleza: só a que se põe na

mesa
cama
e banho (por que não?!)

lagoa, 04/08/07



PS, meio longo: esta brincadeira aí em cima bem pode ser vista (por mim, é claro!) como uma explicação para o fato de ter recortado o poema abaixo e tê-lo portado na carteira, junto com outros talismãs, dos meus vinte anos até que o pedaço de jornal se transformasse em outra coisa que eu já não podia ler. Ou se desmanchado, como diriam os crentes nisto e naquilo. Hoje, desenvolvendo uma frase publicada na revista CATARINA (http://www.revistacatarina.com.br/main.php?show=anteriores&edicao=18)
, editada por minha amiga Carla (prima?!), veio-me a lembrança desta bela fotografia que Manoel Bandeira legou aos atentos.
Claro que não concordo que a vida é “sem finalidade”. Isto é uma muleta para os que acreditam que a felicidade só existe post-mortem. Nem na morte eu acredito. Mesmo porque, ainda com o Bandeira em mente, já vim m’ embora pra Pasárgada e continuo me lixando pro rei.
Ainda assim, convido-os a sorver esta maravilha.


MOMENTO NUM CAFÉ
(Manoel Bandeira)

Quando o enterro passou
Os homens que se achavam no café
Tiraram o chapéu maquinalmente
Saudavam o morto distraídos
Estavam todos voltados para a vida
Absortos na vida
Confiantes na vida.

Um no entanto se descobriu num gesto largo e demorado
Olhando o esquife longamente
Este sabia que a vida é uma agitação feroz e sem finalidade
Que a vida é traição
E saudava a matéria que passava
Liberta para sempre da alma extinta.

3 comentários:

Shasça disse...

Parece que o povo não está conseguindo postar comentários e não sei como resolvert isto. Também não consigo encontrar ajuda.

Anônimo disse...

Eu acho que vc devia ler o Alexei Bueno. Essa sua visão destrutiva da vida, ou ainda, desencantada (e o poema que vc postou lá no seu blog bem mostra isso, embora eu não perceba uma razão pra isso no próprio poema...) pode encontrar um eco na poesia desse nosso poeta contemporâneo, cuja linguagem é realmente muito encantadora, no desencanto poético em que a violência e o desencanto com o mundo surgem como matéria de poesia.
Lembra do Augusto dos Anjos? Pois então! O Augusto na sua procura por verticalizar a destruição e o seu pessimismo com o mundo a seu redor deixou com seu simbolismo um ganho considerável pra poesia modernista. Tanto que hj ainda uma tal poesia metafísica ainda se faça ouvir e calar os corações românticos. E ao calar os corações abre uma outra perspectiva comunicativa, de sublimar o aspecto absconso e imundo de nossos dias... Nada como a poesia pra mostrar que a futilidade é irmã da pressa e oposta ao eterno, irmão da Estética (falo da verdadeira estética, a do Belo, seja ele sublime ou grotesco, pouco importa...).

Bjs,
Susanna.

Anônimo disse...

E mais... Aquele que viu o feretro passar, no momento em que todos estavam voltados para o cafe das vidas deles, aquele sim sabia que a vida era uma agitação feroz e sem necessidade, porque esse sabia que a vida estava no efemero de si propria, e que a unica verdade possivel estava la, no esquecimento, na morte, no hiato profundo, que somente a poesia pode nos dar... O hiato que esse poema de Bandeira sabe provocar em nossos corações... O hiato, meu amigo, necessario para que a vida se renove...
Era isso. Bjs!