13 setembro, 2009

AINDA SOBRE A LAGOA DA CONCEIÇÃO

Todo movimento, pra crescer e ter sucesso, precisa espalhar-se além de suas fronteiras e conquistar quem ainda não faz parte dele. Posto isto, reproduzo aqui o e-mail que recebi de Eduardo Paredes:

"A gente vive na Ilha mais charmosa e legal do mundo e é por isso que é preciso estar lutando e berrando, permanentemente. Sempre tem de ter uma galera de plantão, prá não estragar a festa de vivermos aqui, nesse mesmo espaço abençoado. Adoro o Continente, Coqueiros, Itaguaçu, mas o meu xodó é a Iha e, mais ainda, a Lagoa da Conceição, o lugar que escolhi definitivamente para viver há 30 anos atrás. Essa é a po(r)ção mágica dos druídas, dos loucos, das fadas e bruxos que sabem, reconhecem estar num pequeno pedaço do paraíso. Convivemos com uma massa bovina, alienada, é preciso reconhecer, mas que existe em toda cidade hoje em dia, em toda a parte do planeta e no Brasil. No entanto, aqui, aos poucos já dá prá notar uma maior inclusão cultural, que na minha opinião até antecede à social e econômica. E isso muito mais por conta das ações da sociedade civil organizada e mesmo desorganizada do que pela atenção e sensibilidade dos senhores governantes, dessa classe política que nunca parece estar à altura do povo que os elegeu. Por isso, a importância dos artistas, das artes, dos produtores culturais, dos arte-educadores tem de ser reconhecida e apoiada pelos poderes públicos, municipal e estadual, executivo e legislativo. O Judiciário que apenas cumpra a lei que já tá de bom tamanho. Floripa, em relação ao resto do país, pelos índices da ONU e do IBGE, até que tá bem na foto. E mesmo o Estado todo, tirando a chuva que já está encharcando de novo, mantém um ritmo de produção industrial e agrícola, apresentando qualidade e diversidade, com padrão internacional.
Só que Floripa é especial. Essa terra, só pode ser pela sua beleza e encantamento, tem mais artista que qualquer outro lugar do planeta em proporção ao número de habitantes. Cidade desse porte e muito maiores tem aos montes, por toda a parte. Mas aqui tivemos Cruz e Souza, Vitor Meirelles, Martinho de Haro, Virgílio Várzea, José Boiteux, Grupo Sul, Cascaes, Hassis, Eli Heil, Vichetti, Luiz Henrique Rosa, Neide Mariarosa, Salim Miguel e toda uma constelação de nomes ilustres que podemos virar uma noite lembrando e com muitos quais ainda tive a felicidade de conhecer e conviver . A imensa maioria das cidades no mundo não tem uma referêncial cultural sequer para apresentar e somente as grandes metrópoles concentram e atraem os astros-artistas como um buraco negro, pois somente lá é possível encontrar um público para a sua arte. Mas aqui é cachoeira. Covardia!!! Mas falta público, não passivo, mas participativo.
Só que a galera continua a todo vapor, com diversas gerações se cruzando, se permeando, criando prá caralho, aqui e agora, com ou sem governo. Simplesmente não pára. Por isso Floripa é sim ducaralho!!!!
Tirando as palhas e os palhas, tem muita coisa - e da boa - acontecendo na vida cultural da cidade. As pedras estão rolando: aprovação do Conselho Municipal de Cultura hoje (parabéns a todos que batalharam), a atuação da Frente em Defesa da Cultura Catarinense (que se manteve viva e não pode apagar nunca), da Cinemateca, o Funcine ativo, vários cineclubes com excelente programação gratuitamente, pontos de cultura como o Carijós, o FAM e Mostra Infantil consolidados nacional e internacionalmente, o prêmio Elisabeth Anderle sendo cumprido (parabéns e merda, também, a todos os premiados dessa fornada divulgada hoje), beneficiando projetos de inúmeros artistas e grupos, em todas as áreas. Tem a UFSC, com o novo e maneiríssimo centro de convivência, e a UDESC sempre com uma moçada bonita, criativa e abusada, o que é ótimo. Uma porrada de outras coisas que não vou lembrar agora também comprovam essa efervescência natural.Toda hora tem um puta show, um amigo músico se apresentando, o lançamento de um livro de contos ou poesia, de um longa ou de um filme da nova raça, um curta ou documentário, tem sempre uma peça estreando (na UBRO, na trincheira do Armação ou no Sol da Terra), o movimento Hip Hop aproximando a galera da periferia da arte, do esporte e da cultura. Isso tudo tá rolando e por isso essa cidade, que já é linda por natureza, continua ducaralho. E não podemos deixar a corda roer.
Sempre fui da militância - estudantil, jornalística e cultural, desde a época da ditadura -mas aqui, desde que cheguei, continuei batalhando principalmente junto à cultura e às questões ambientais, sobretudo da Lagoa. Foram várias trincheiras: na Cinemateca, na criação da nossa Lei Estadual e do Funcine, no MIS, na Frente da Cultura em 2005, em movimentos sociais, comunitários e ambientais dos quais particiei, que ajudei a agitar, a ser parceiro porque acreditava. Você doa força, energia e tempo, mas também ganha e o que mais ganhei, de melhor, foi uma pá de amigos e amigas, companheiros e companheiras, gente maluca mas ética, doida mas com caráter, pessoal que vai à luta e não se intimida. Esses são os que nos marcam como tatuagem, que a gente leva na pele e no coração. Mas, engraçado, sempre me restou a sensação de que, apesar de tantas coisas, pequenas e grandes, conquistadas ao longo do tempo, da visível transformação para melhor nos aparatos, mecanismos e infraestruturas que temos hoje em relação ao que era há vinte anos atrás, quando toda uma galera irada se juntou e deu um sopro de vida nas artes e na cultura dessa cidade, tirando a poeira e o bolor da caretice e da pasmaceira geral, apesar de todos esses avanços, sinto que as coisas ainda não fluem para uma grande e coletiva gozada. E as coisa não são melhores porque, me parece, ainda impera cada um puxando a corda pro seu lado. É uma porrada de gente, de movimentos, de ações, todas justas, dignas e nobres,mas sempre isoladas, sem liga e acasalamento, o que dilui a força da raça. E na arte e na cultura todo mundo é índio da mesma tribo e devia lutar junto.
É fato que, ao longo da história da humanidade, ao poder político nunca interessou uma sociedade muito crítica, porque isso significa independência, o que, para os que se encastelam no poder, é um perigo, real e iminente, de primeiro grau. E aí bate de frente com os artistas, as "antenas da raça", que se não forem controlados, desarticulados, podem e costumam dar dor de cabeça, até mesmo insurgir o povo contra os poderosos. Continuo achando que esse mundo melhor, essa utopia que nos alimenta, vai ficar mais parecido com o que desejamos quando todo o nosso povo da arte e da cultura se juntar, deixar de olhar pro próprio umbigo e erguer a cabeça prá enxergar o que revela a panorâmica à nossa frente.
Me parece que todos nós, os mais rodados e essa galera nova sangue bom, que todos os movimentos em defesa de alguma coisa boa, útil e comunitária não se dão conta do poder dessa força toda reunida, da sinergia que pode ser criada com tantas cabeças iluminadas do cinema, do teatro, da literatura, da dança, das plásticas, das artes gráficas, prá não falar da música, que é brincadeira.
Porra, a gente vive numa cidade que tem uma puta produção cultural, que gera renda e emprego, que dá a identidade ao povo catarinense, que é de interesse do turismo, mas ainda rateamos prá canalizar toda essa energia e fazer uma revolução cultural, social e ecológica em Floripa, que sirva de exemplo prá todo o resto do país. A exemplo de outra ilha mais acima, a dos barbudos do Fidel, aqui também poderia ter uma pequena grande revolução. Mas, insisto, falta articulação, força na representatividade e ainda são poucos, mas bravos, os que estão na linha de frente. É a legítima roda dos expostos, a minoria que toca e carrega o piano prá maioria individualista e ruminante. Todas as lutas são importantes e deveriam, se fosse possível, ser lutadas por todos o tempo todo.
Só que nessa loucura toda tem uma coisa que conspira contra: o tempo - ó tempo rei! Esse é implacável e corrosivo para muitas coisas, por uma única razão: o risco da extinção do que é perecível. E aí entra o patrimônio público, que é tanto o casario centenário em ruínas como o espaço verde. Se a casa cair, fudeu. A Lagoa vai ser uma selva de pedra só, mas todos os artistas e produtores culturais, que também são cada um um cidadão e uma cidadã, vamos todos perder uma excelente oportunidade e um espaço de criação que jamais vai ser reposto.
Desculpem o laudatório, mas fazia tempo que eu não pintava na Frente e acho que não podia deixar de dar esse toque. Tanto o patrimônio histórico, arquitetônico e cultural, assim como o paisagístico e ambiental, todos são patrimônios públicos.
E acho que podemos estar juntos, sempre que a causa for nobre os parceiros leais.
A vida de todos vai melhorar com certeza, a cidade vai ficar mais humanizada e continuar prazerosa, nossos filhos serão mais felizes e as futuras gerações nos agradecerão por algum dia termos lutado prá ter deixado esse mundo um pouco melhor ou menos pior. Sempre fui otimista, sei que falta muito a ser feito, mas o tesão de mudar é sempre maior.
Vamos bater cabeça, galera, que nem pai de santo. Ou seja, vamos nos juntar.

Saudações e bom findi, sem baixar a guarda.

Eduardo Paredes"


E NÓS COM ISTO?
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Ps.: para saber um pouco sobre E. Paredes, clique no nome dele lá em cima.

2 comentários:

Bruna Berka disse...

Essa é a saída. Espero que o projeto possa ser executado. Está mais do que na hora do poder público se preocupar com o bem estar da população proprocionando espaços como esse. Mesmo sabendo que a Ilha é um dos lugares mais lindos do mundo, só isso não basta, precisamos de estrutura para manter e ordenar essa beleza.
Abs e legal o Blog

Shasça disse...

Brigadim pelo apoio, Berta. Quanto mais gente envolvida, melhor.
Já tou lá te twittando e seguindo teu blog.
Bejotas.
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