Assim, fechamos com um papo leve, antes das próximas bordunadas.
Curta o show de Ana e ouça a gravação do Zuco 103 num dos HYPERLINKS (palavras realçadas).
Carpe!
cuja & cujo
(há quem diga
que preto não nasce
surge)
dita e dito
nasceram num
desses morros do macaco
numa dessas
favelas por aí
onde poucos fartos
despejam
o que muitos ditos
e ditas
disputam com as
moscas
como escaparam à
natural seleção social
dito e dita
cresceram
cada qual no seu
barraco
unidos na fome
no
lixo
e
no espanto de estar vivo
dito
enquanto crescia
sonhava ser cantor
jogador ...or
...or
não deu
foi fazer avião
devido lugar de
ditos
dita
enquanto crescia
sonhava ser
cantora
professora ...ora
...ora
não deu
foi ser doméstica
devido lugar de
ditas
o que dito e dita
sonhavam
era puro delírio
eram pobres e
pretos
e se pobre branco
já não dá sorte
imgine preto pobre
(rico
preto
ainda
fecha os olhos
preto
pobre pesadela)
dito era sempre o
primeiro a ser preso
sempre pelo que
era
nunca pelo que fez
dita perdeu a
virgindade
(que
inocência depende
de
se ter alma branca)
junto com a do
patrãozinho
e a dos seus amiguinhos
a patroa
com a dignidade
ferida
botou-lhe porta
afora
na rua outra dita
foi na subida do
morro
como diz o samba
que dito viu dita
dita viu dito
sorriram-se
gostaram-se
e como pouca
desgraça é bobagem
resolveram somar
as suas
e dividir num
barraco
as ilusões
as barrigas
rajadas
as doenças
venéreas
tudo a que os
ditos e ditas
têm direito
todos os dias
dito bebia e batia
em dita
dita fugia e traia
dito
dito batia e não
entendia
porque ainda
sofria
dita traia e não
entendia
porque ainda
sofria
nem dito nem dita
em sua via crucis
percebiam
que o seu sofrer
convinha ao bacana
que do seu duplex
& whisky & sol
cuspia no mesmo
morro fudido
onde mandava
buscar sua alegria
nem dita nem dito
em sua angústia
compreendiam
sua maldita sina
lá no seu zinco
esgoto e só
tão perto e tão
longe
debruçados sobre a
casa grande
os culhões
enredados em
humildade e esperança
e foi depois de
mais uma sessão
de porre e porrada
que dito
enfrentou-se
seguindo a lição
do avô:
pendurou-se na
cumeeira
e lá ficou
dançando como um
frango
com aquele olhar
de quem trucou o zap
e foi depois de
passar a acreditar
na existência do
mal
que dita
entregou-se
ao evangelho
segundo qualquer paletó
aproveitando uma
promoção no dízimo
oferecido por uma
nova igreja lá do centro
(o
disc-jockey era irresistível:
“não
percam
um
pecado é três
três
é dez”)
corre lá no morro
que a tragédia virou
um samba enredo mas este foi
desclassificado na escola
por excesso de estranheza
das gentes e escassez
de alegoria adequada
3 comentários:
São muitas verdade reunidas.
Vou ouvir de novo...
pois eh querido Shaça, o eco que vem antes da palavra, eh a verdade batendo na car adagente.. obrigada por vc ter me passado esse texto maravilhoso pra eu cantar, falar contar com o zuco... ainda me arrepio quando penso como esse texto chegou a nossas maos... tinha que ser assim... o uninerso e deuses da musica queriam que essa estoria fosse contada em forma de drum and bass, eletrico forte sofredor.... batida de pes que choraram ao dançar esse som.
Lilian Vieirissima do zuco 103
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